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quarta-feira, 11 de abril de 2007

Aeroporto José Sócrates

(ou, dito de outro modo, 7 perguntas sobre o mais absurdo investimento público da história da democracia)

O Governo vai recuar na decisão de construir o novo aeroporto na Ota?

A Ota assenta na "Santíssima Trindade" que governa o país desde há muito governos a quererem fazer "obra de betão", para criar emprego-rápido-antes-das-eleições, aliados ao poderoso "lobi" da construção civil e imobiliário, tudo abundantemente financiado por bancos.

Por vezes, obras desta envergadura têm "pelo menos" a vantagem de não serem tão polémicas. Não é o caso deste aeroporto. Pelas razões seguintes

1. A Ota é um bom local para aterragens e descolagens - o essencial de um aeroporto?

A zona da Ota tem a Serra de Montejunto a norte/poente e a vila do Carregado a sul. Pelas condições da orografia, as duas (únicas) pistas serão colocadas na orientação norte-sul. Ou seja, a conjugação destes factores torna-o um local sofrível para aterrar. Além disso, é uma zona de nevoeiros frequentes, que atrasam o ritmo de operação aeroportuária, com ventos traiçoeiros, segundo a Força Aérea. Não é por esta razão que a Ota se tornou local ideal para construir um aeroporto.

2.A Ota só pode ter duas pistas? É mesmo verdade?

É verdade e nem mesmo o Governo o nega. São mesmo só duas. De um lado está a Serra de Montejunto e do outro lado a auto-estrada Porto-Lisboa e o rio Tejo. Não há por onde fazer crescer pistas, factor essencial para poder responder a um crescimento do tráfego aéreo que ninguém consegue prever qual será.

3.Mas duas pistas não chegam? Não é mania das grandezas querer mais?

Um bom aeroporto, hoje, é equacionado como cidade-aeroporto, e sempre numa perspectiva de expansão. Barajas, em Madrid, por exemplo, tem já hoje cinco pistas. O crescimento da Portela está condenado, porque todas as construções feitas em seu redor não lhe permitem passar de uma para duas pistas. Mas o Governo considera que fazer uma obra de três mil milhões de euros, a 50 quilómetros de Lisboa, para passar de uma para duas pistas, é um bom investimento. Repare-se a Portela estará, já hoje, perto de uma capacidade máxima das 40 operações por hora, em pico máximo. Todavia, os primeiros estudos da empresa de Navegação Aérea de Lisboa (NAL), encomendados pelo Governo, diziam que a Ota tinha capacidade para 40 operações por hora. Enfim, o Governo mandou estudar melhor e talvez a Ota chegue a 70 ou 80 aterragens/descolagens por hora. Mas nenhum estúdio conseguiu ainda fazer aumentar o espaço disponível e tudo se cinge a duas pistas, uma delas situada em leito de cheia, num zona de grandes declives, que gerará uma astronómica movimentação de terras - 44 milhões de metros cúbicos (dava para fazer uma Muralha da China).

4.O que dizem os técnicos?

Há dois tipos de técnicos, ambos qualificados os que estão a trabalhar para o Governo, e os que dão opiniões por sentido cívico. Há uma conclusão consensual: todos têm razão. Os professores do Instituto Superior Técnico - a principal fonte de conhecimento portuguesa nesta matéria - são frontalmente contra este aeroporto, pelos custos absolutamente excessivos e falta de capacidade para crescimento da Ota. Do outro lado, estão os engenheiros e empresas que vão construir o aeroporto e que tornam possíveis todos os desejos do Governo. A engenharia é a ciência de tornar possível o impossível.
A que preço? Depende do número de vezes que deixarão derrapar prazos e orçamentos...

5.Mas o aeroporto não é grátis? Não é tudo pago pela UE e pelos privados?

Na verdade, o aeroporto vai ser pago pelos passageiros que lá vão aterrar, pela absorção pelos privados da ANA (os mais importantes e rentáveis aeroportos portugueses serão privados, ficando os deficitários a ser suportados pelo Orçamento de Estado) e falta ver quem fica com os terrenos da Portela para construir muitas, e muitas urbanizações em plena Lisboa...

6.E o ambiente, não é importante?

A preservação do território e do seu ambiente natural é uma das condições essenciais à sobrevivência do país. Daí que a opção "Rio Frio", na margem Sul do Tejo, fosse excluída à partida. Mas, há um problema de base daqui a 40 anos vai-se destruir uma outra parcela de território para fazer um novo aeroporto, por saturação da Ota. Por essa razão, muitos especialistas defendem que na Margem Sul do Tejo (Poceirão ou Faias) há capacidade para fazer um aeroporto expansível e de custos ambientais mais reduzidos do que os de Rio Frio (onde a destruição de sobreiros seria maior).

7.Sim, sim e alternativas, digam alternativas?

Como diria o primeiro-ministro, a decisão está tomada e quem quiser que apresente estudos alternativos. É simples caro leitor, não quer pagar um estudo que analise um aeroporto alternativo? De um lado está o cidadão, e do outro o Governo com milhões de euros (o dinheiro dos impostos) a fazer estudos para justificar o que pretende À pergunta "Qual a alternativa à Ota?" só resta devolver a questão ao Governo. A dúvida é esta a justificação-base para a localização na Ota assenta no facto de ser a "menos má". E, portanto, é de concluir que hoje, ano de 2007, não há outra. Ora, quando a Ota estiver saturada - 20, 30 ou 40 anos depois de ser inaugurada - onde se vai meter o novo aeroporto de Lisboa? No local para onde não se quer ir hoje? E será que nessa altura, na Margem Sul do Tejo (Poceirão, por exemplo), não terá crescido entretanto uma malha urbana que torne essa hipótese impossível? Não seria mais lógico ir já para lá, onde a capacidade de expansão de um aeroporto não estaria comprometida, onde o terreno é plano para construir e aterrar e onde o ordenamento da malha de transportes permitiria fazer coincidir o TGV Lisboa-Madrid com o TGV Lisboa-Porto numa estação ferroviária em pleno aeroporto? Além disso, existiria uma proximidade estratégica à Plataforma Logística do Poceirão, já em construção, que responderia ao brutal crescimento da carga aérea.

Conclusão

O Governo resolveu agir com os pressupostos que lhe foram legados por muitos anos de estudos. No momento actual, contudo, o TGV, a logística e o crescimento do transporte aéreo ganharam uma nova dimensão e ultrapassaram a decisão de 1999. Mas Mário Lino e a sua equipa mantêm-se agarrados a uma decisão "rápida", caríssima (mais de três mil milhões de euros), de prazo difícil de assegurar e com um tempo de vida limitado.

Tudo porque não há alternativa. Mas será que, depois da hipotética Ota, Portugal nunca mais vai poder construir um aeroporto em Lisboa?

(in JN - Sábado, 7 de Abril de 2007)

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